Grande Entrevista ao Presidente do Conselho de Administração do Grupo H Dr. Antonio José Henriques - Região de Cister


O presidente do conselho de administração do Grupo H Saúde diz, em entrevista ao REGIÃO DE CISTER, que o processo de atribuição da convenção para a abertura do Centro de Diálise na Benedita foi um verdadeiro calvário e que não teve alternativa se não afrontar o PS, partido ao qual pertence, para desbloquear o impasse.

REGIÃO DE CISTER (RC) > Aguardava há muito tempo pela abertura do centro de diálise na Benedita. Foi um processo difácil?

ANTÓNIO JOSÉ HENRIQUES (AJH) > Foi um processo difícil e longo. Teve início em 2009, quando identificámos cerca de 80 pessoas da zona da Benedita que faziam hemodiálise e se deslocavam às unidades nos concelhos limítrofes para fazer os tratamentos. Entendemos, nesse momento, que deveríamos fazer algo para melhorar a qualidade de vida desses doentes. Disso demos conta ao Ministério da Saúde, pois considerávamos que não fazia sentido que estas pessoas fizessem 200 quilómetros por dia, três vezes por semana, com custos elevadíssimos para o Estado, havendo uma solução que servia todas as partes. Recordo-me que fomos abordados por uma multinacional, que se mostrou interessada em estabelecer uma parceria para o efeito, mas após alguns contactos decidimos avançar sozinhos. Com alguns constrangimentos, é certo, mas sempre gostei de pensar pela minha cabeça. O processo demorou algum tempo, fizemos as obras dentro de todos os trâmites legais e depois chegou a parte mais difícil do projeto. Recebemos a licença de utilização em maio do ano passado e, a partir daí, começou um verdadeiro calvário. Havia uma recusa na atribuição da convenção, mas mostrámos uma grande resiliência e nunca desistimos de fazer valer o interesse do grupo e, sobretudo, o interesse dos doentes. Seguimos um caminho em que tornámos público o sentimento de in- justiça que sentíamos. Fizemos os protestos que entendemos serem necessários, até recebermos a confirmação oficial de que iríamos receber a convenção. O processo está para despacho na Administração-Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e contamos abrir ao público no próximo dia 1 de setembro.

RC > Falou das ações de protesto. Como é que um destacado dirigente do PS vem para a rua questionar um Governo do próprio partido? Pode ter sido prejudicado precisamente por ser militante do PS?

AJH >Não vejo as coisas dessa forma. Sou do PS, mas acima de tudo defendo as pessoas, que é um obrigação tanto do Partido Socialista como do Governo. Esta é uma questão de princípio: ia lutar até às últimas consequências por este objetivo. As pessoas devem assumir as suas responsabilidades. Sempre defendi o PS em vários momentos, mesmo quando ninguém o queria fazer, mas penso pela minha cabeça. Não sou um ‘yesman’, não estou, digamos, enquadrado em certas linhas de pensamento. Gosto mais da minha terra, do meu concelho, da minha região, o que me dá liberdade de contestar, mesmo contra o meu Partido, nos momentos em que este as suas políticas vão contra aos interesses dos cidadãos. O que me preocupa é ver que algumas pessoas, depois de eleitas, defendem os interesses pessoais em detrimento do interesse comum. Isso é o que devora a política. É o cancro da democracia. Por isso é que assistimos ao surgimento destes fenómenos populistas por toda a Europa e, um dia, chegará ao nosso País. É uma vergonha ao que assistimos. A política é um ato nobre, mas falta ética na conduta política.

RC > Mas não há fome que não dê em fartura. Parece que vai surgir mais um projeto de diálise no concelho, desta feita na Maiorga. Como é que olha para este dado?

AJH > Li qualquer coisa nos jornais, mas não deixa de ser curioso. As pessoas não compreendem como é que se criaram tantos obstáculos para abrir na Benedita e agora se ouve dizer que, depois de resolvida a questão da Benedita, vai abrir mais um centro de diálise no concelho de Alcobaça. É estranho, mas também foi para isso que foi criada uma associação do setor e que, certamente, se irá debruçar sobre estas matérias. O objetivo da Associação Nacional de Unidades de Diálise é que o tratamento de diálise no País tenha maior coordenação. Neste momento, o mercado está entregue a dois ou três players e o sistema político está refém desta situação. Para bem de todos, torna-se urgente alterar este quadro.

RC > Está ligado à saúde há décadas. Que análise faz da evolução do setor privado? Não começa a haver muito negócio e pouco serviço público?

AJH > Há uma complementaridade. O privado terá sempre de existir, para complementar um Serviço Nacional de Saúde que é um dos melhores do mundo, mas ao qual faltam meios. A grande dificuldade é a falta de recursos, meios, investimento e uma gestão adequada. Fala-se sempre na questão financeira, mas para mim trata-se mais de uma gestão deficiente dos dinheiros públicos e dos recursos humanos. Há algo que tem de mudar: devia acabar-se com esta promiscuidade de termos profissionais a trabalhar no público e no privado em simultâneo.

RC > Para onde caminha o grupo H Saúde?

AJH > Nos últimos dois anos apostámos muito na diálise e tivemos pouco tempo para pensar em novos projetos, mas queremos criar uma unidade que tenha um bloco operatório de ambulatório. Costumo dizer que a Benedita é uma verdadeira centralidade e não é ‘apenas’ a freguesia mais a sul do concelho de Alcobaça. A Benedita acaba por estar no centro de uma região que apanha territórios da Nazaré, Caldas da Rainha, Rio Maior, Porto de Mós, entre outros concelhos. É no sentido de servir essas populações que queremos desenvolver o Grupo. Há a possibilidade, também, de desenharmos uma unidade de cuidados continuados. Este projeto já podia estar numa fase mais avançada, mas fomos obrigados a focar-nos muitos na diálise e a colocar em ‘standby’ outros projetos.

REGIÃO DE CISTER (RC) > Foi adjunto do presidente Miguel Guerra, depois vereador e, mais tarde, candidato derrotado à Câmara de Alcobaça. Estamos a dois anos do início de um novo ciclo político no concelho, com a saída de Paulo Inácio. Como perspetiva esse ciclo? O PS está preparado para se apresentar como alternativa?

ANTÓNIO JOSÉ HENRIQUES (AJH) > Não há dúvida que a responsabilidade de o PSD estar no poder há 22 anos é da oposição. A culpa é nossa, por não arranjarmos alternativas credíveis e assumo a minha quota de responsabilidade, enquanto militante do PS. Acontece que só se consegue ganhar a Câmara desde que o partido esteja unido. Sou um homem de consensos, procuro servir o concelho e o partido tem de ter essa postura. Para chegar ao poder, o partido tem de estar organizado. É necessário gerir convenientemente os interesses individuais, que são legítimos, sem que haja conflitos. Esse clima de divisão, obviamente, colide com um projeto que seja conciliador e que possa vir a servir o concelho. O PS tem condições para ganhar a Câmara de Alcobaça daqui a dois anos. Temos bons quadros. Por que é que não ganhamos? Porque quando chegam as eleições sucedem sempre situações que levam à desunião. Isto tem-se arrastado. Fui candidato à Câmara em 2001, contra Gonçalves Sapinho, e não me criaram problemas internos, mas isso só aconteceu porque ninguém queria enfrentar um presidente de Câmara que tinha apenas quatro anos de mandato... Servi o partido e, infelizmente, até hoje ninguém conseguiu ter um melhor resultado no PS. Sou socialista, mas não sou obcecado. O importante são as pessoas. Devemos ter uma postura de gerar consensos. Seja nas empresas ou na política. E, depois, as pessoas têm de ter noção das suas capacidades.

RC > É verdade que se disponibilizou para ser candidato a deputado do PS?

AJH > Não, não é verdade. Fui confrontado numa reunião da Comissão Política Concelhia de Alcobaça sobre um facto: o meu nome ia ser indicado para Leiria e seria num lugar elegível. Nunca quis ser deputado, até porque considero que não tenho perfil para a função. Com todo o respeito pelo trabalho dos deputados, considero-me um homem do terreno. Se quisesse ser deputado teria reivindicado isso há muito tempo. Já servi o partido no passado, podia ter exigido um lugar, mas nunca exigi nada ao PS. Não é essa a minha postura.

RC > Ficou desiludido por nenhum dos três nomes indicados pela Concelhia de Alcobaça à Federação ter sido incluídos na lista de candidatos a deputados por Leiria? Considera isso normal?

AJH > Não gosto muito de falar do que se passa dentro dos partidos, mas não fiquei satisfeito. Alcobaça merece ser respeitada em Leiria. Alcobaça é o segundo maior concelho do distrito e há quantos anos não temos um deputado e peso político? Alcobaça tem de se fazer respeitar. Esta Comissão Política Concelhia não é perfeita, mas tem tido alguma visibilidade e o PS vive um momento favorável em termos de sondagens, graças ao trabalho do primeiro-ministro. Ganhámos pela segunda vez na história as eleições europeias em Alcobaça e o partido vive uma onda positiva, que se vai refletir noutras eleições. Temos de galgar essa onda e fazer com que isso tenha impacto nas próximas eleições autárquicas. O PS/Alcobaça tem de saber atalhar caminho, ouvindo toda a gente, criando consensos e sem processos de exclusão. Se o conseguir, ganhará a Câmara. Acredito piamente nisso.

RC > Fala de união, mas o PS/Alcobaça retirou a confiança política a um vereador...

AJH > O vereador César Santos é eleito, tem toda a legitimidade para exercer o mandato, pois foi eleito pelo povo. A Concelhia entendeu retirar-lhe a confiança política e o processo está a seguir os trâmites normais a nível interno. A única coisa que digo sobre esse assunto é que o partido tem de ter uma postura de unidade para poder ganhar as próximas eleições em Alcobaça.

RC > Tendo em conta o peso efetivo que tem no Oeste e no distrito, Alcobaça revela pouca representatividade política, pois continua a ficar longe dos lugares elegíveis para deputados. A que é que isso se deve?

AJH > Há falta de liderança. E há, também, alguma falta de resiliência política das pessoas que estão nos órgãos de poder autárquico. Temos de lutar para que as coisas aconteçam, não nos podemos resignar, não nos podemos ficar pela primeira nega. É preciso acabar com a eterna troca de e-mails entre os chamados gabinetes do poder, onde parece que se decidem as coisas. Alcobaça não tem uma liderança política forte, talvez desde que Gonçalves Sapinho saiu da Câmara. E, obviamente, de Miguel Guerra. Os tempos eram outros, mas fez-se um trabalho notável na Câmara com Miguel Guerra. Um trabalho que não se vê, mas que foi essencial para a afirmação do concelho. Podia falar das estradas, do saneamento, mas falo da zona industrial do Casal da Areia, que muitos apontavam, à época, como um elefante branco. Pois bem, imagine-se o que seria Alcobaça sem aquela zona industrial? Alcobaça é um concelho de grande pujança. Alcobaça era respeitada pelos seus pares, agora penso que falta mesmo uma liderança forte.

 

Falta Capacidade Reivindicativa

“As pessoas da Benedita focam-se no trabalho e esquecem a política”

António José Henriques tem vários investimentos na Benedita, uma freguesia que o empresário considera ser “uma centralidade”, mas à qual falta capacidade para reivindicar investimentos das entidades públicas.

“A Benedita é um território onde vive gente extremamente empreendedora. Mesmo a crise que atravessámos há uns anos sentiu-se menos na Benedita do que no resto do País. E porquê? Devido ao trabalho dos beneditenses. Só que a Benedita tem pouca capacidade reivindicativa em termos políticos. A Benedita tem direito a ser tratada e respeitada como merece, não pode ser a última freguesia do concelho de Alcobaça”, nota o administrador do Grupo H Saúde.

“A Benedita tem um potencial muito forte, mas tem acessibilidades péssimas. Temos uma zona industrial a abrir e as empresas a fugirem para Rio Maior e Caldas. Quem trabalha muito não tem tempo para a política. E na Benedita as pessoas focam-se imenso no trabalho e esquecem-se da política. São vítimas dessa forma de estar”, lamenta António José Henriques.

 

quarta, 14 de agosto de 19